Quem sou eu

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Nasci em Floripa, vivo em Miami e sou apaixonada pela África. Adoro viajar e explorar novas culturas. Tenho especial interesse pelas diferenças. Este é o meu caderno de 'viagens' aberto ao publico. Seja bem-vindo (a)!

19.3.09

Cape Town 13: Changes


Cape Town está diferente. Desde que os últimos amigos foram embora e a grana está ficando escassa, o clima de férias que durou quase três meses tem tentado me mostrar que todo Carnaval tem a sua quarta-feira de cinzas. Não que eu tivesse esquecido, mas simplesmente não quis lembrar. Vivi três meses ocupada somente em desfrutar as experiências que a vida vinha me apresentando. E as chances foram tantas que uma ou outra deixei escapar de propósito, como quem pensa: eu já tenho o suficiente.

Não passei um dia sem ter estado feliz, sem ter botado a cabeça no travesseiro e pensado: como o dia foi bom. Algo mágico aconteceu comigo que não me deixou enxergar os problemas e que apagou do meu vocabulário a palavra preocupação. Nem a saudade me importunou. Um dia ela virou para mim e disse: quando você estiver perto da felicidade, vai estar muito longe de casa, é isso mesmo que vocês quer? Eu optei por estar feliz em primeiro lugar, pois assim eu administraria muito bem a saudade. Digamos que pedi um sanduíche e ganhei um combo.

Mas C.T. não está diferente só aos meus olhos, a cidade está mudando, de verdade. A estrela Dalva não aparece mais em frente à minha janela, aliás, eu nem sei por onde ela anda. A lua não é mais minha vizinha, parece ter se mudado para os lados de Grrenpoint. O sol também não brilha mais como antes. E para completar, ontem levantei no meio da noite para calçar uma meia. Depois de um dia de praia e temperatura beirando os 35ºC, repentinamente tivemos que tirar os casacos do guarda-roupa. A penínsola está com ares de serra e embora tenha perdido um pouco do calor, não deixou de ser interessante. O inverno deve ser gostoso aqui, embora eu tenha ouvido dizer que chove praticamente todos os dias. Por enquanto ainda tenho esperança de pegar mais uns dias de praia.

Até o fim da semana devo saber a resposta sobre a renovação do meu visto. Se tudo der certo, ele será estendido por mais 3 meses. Ainda não sei se vou ficar até julho, tudo vai depender de eu conseguir um emprego que ajude a me bancar e a aprender inglês, caso contrário, vou fazer a tão sonhada viagem para a Namíbia como despedida e voltar pra casa.

Talvez eu não fique para curtir o frio, não sei. Só sei que continuo firme na filosofia de fazer planos a curto prazo. Só o hoje me interessa. O amanhã, quando ele chegar é que eu vou vivê-lo.

Cape Town 12: Learning


Vida vai, vida vem e eu continuo na casa da Rica. Como só tinha pago um mês de curso de inglês e hospedagem quando saí do Brasil, deveria deixar a host house quando a próxima estudante chegasse. Acontece que a Rica me deixou ficar. Pôs a filha a dividir o quarto com ela e me deu o quarto da filha (a Lisa, aquela que não descobri se não gosta de mim ou se não gosta de gente, mas que agora tenho certeza que não gosta de mim em virtude do acontecido). Só sei que para mim foi a melhor das opções. Continuei em Sea Point, meu cantinho preferido em C.T., num lugar seguro e onde posso cozinhar e lavar em casa a minha roupa – o que é bem importante quando se mora fora.

Com a vinda da nova estudante e posteriormente da irmã dela, já que as duas preferiram ficar na mesma casa, éramos cinco mulheres. Foi uma época bem boa. Um mês em que eu tive ótimas companhias para passear, almoçar, rachar o taxi e conversar depois da balada, quando eu normalmente voltava querendo compartilhar as minhas impressões em português. A Nahyana e a Morgana se tornaram minhas grandes amigas e fizeram especial a minha estadia em C.T. Quando elas foram embora demos para a Rica um cartão de thank you e um porta retrato com a foto de nós cinco. Ambos ela exibe orgulhosa no aparador da sala de jantar.

O gatinho de três patas ainda tenta ser meu amigo. O destino me deu a chance de conviver com um bicho de estimação para ver se eu perco esse medo ridículo, mas confesso que não estou muito interessada, embora ele seja realmente um amor de criatura. Toda vez que vou para o sofá com meu prato de Sucrilhos ele vem sentar do meu lado. Como vou me encolhendo, ele dá meia-volta e sai fora. Um dia sentei no braço do sofá, perto dele, porque estava disposta a uma aproximação, e ele abanou com a patinha da frente, fazendo sinal de “vem”, me pedindo para chegar mais perto. Naquele dia eu desconfiei que ele lê pensamento. Ele decifra o nosso humor e sabe quando se aproximar sem ser inconveniente.

Outro dia eu estava sentada na cama e ele apareceu no meu quarto. Queria subir na cama, junto comigo. Eu olhei para ele e pensei, nãoooo, gatinho, aqui não, então ele subiu na ponta oposta da cama e lá ficou encolhido. Como viu que eu não dava bola, virou a cara para a parede. Eu queria fazer alguma coisa para ser legal com ele, então liguei o computador e botei Tom Jobim para ele escutar. Com certeza ele teria preferido que eu fizesse um carinho, mas este seria um passo muito grande para eu dar naquele momento. Ele ouviu de olhinhos fechados.

Engraçado foi no dia da viagem para Jeffrey’s Bay. Abri a porta de casa e coloquei minhas malas no corredor. Em seguida vim buscar a bolsa no quarto e, de repente, quando olho, o gato está saindo pela porta. Comecei a me desesperar, porque eu jamais teria coragem de pegá-lo no colo e trazê-lo de volta, então quase chorei imaginando ele fugindo, eu perdendo a viagem e depois tendo que explicar para a Rica que deixei o gato dela escapar. Comecei a chamar, “please, come on little boy, come back, pleaseeeeeee” - e ele não me dava a menor bola. Deu uma voltinha no corredor, voltou e sentou em frente à porta. A esta altura eu já tinha tocado a campainha do vizinho para pedir ajuda, o próximo passo seria chamar o bombeiro ou a polícia, sei lá. Nisso resolvi prestar atenção no que ele estava fazendo. Ele estava sorrindo. Contando ninguém acredita, mas ele sentou em frente à porta e enquanto um vento forte batia na cara, ele mexia a cabeça bem devagar e sorria, como se dissesse: “hummmm, que delícia, que cheiro de liberdade”. Ele sorria sem mostrar os dentes, só fechava os olhos e franzia a carinha. Comecei a compreender a importância daquilo para ele. Posso não ter intimidade nenhuma com animais, mas acabei descobrindo que a minha facilidade para lidar com crianças pode ser útil no convívio com animais inteligentes. Então o deixei a vontade e fiquei mais a vontade também, até que ele deu meia-volta, entrou em casa sozinho e voltou para o sofá.

15.3.09

Cape Town 11: Enjoying Cape Town


É muito fácil gostar de Cape Town. Os brasileiros têm especial facilidade, pois alguma coisa na África do Sul lembra muito o Brasil. Algo que fica entre o céu e a terra. Algo que não pode ser visto, mas pode ser percebido pairando no ar. As vezes sinto como se estivesse em Balneário Camboriu e Floripa fosse ali do lado. Não me sinto como se estivesse a um oceano de distância, mas como se não tivesse saído do Brasil. Talvez ele é que não tenha saído de mim. Talvez é porque ele tenha saído da África...

Eu havia dito que poderia estar em qualquer outro lugar do mundo neste momento, que a minha experiência pessoal seria igualmente rica, mas me afeiçoei a Cape Town como se aprende a gostar de um futuro melhor amigo. Sinto-me agarrada à cidade como quem abraça um travesseiro imaginando ser uma pessoa querida.

Gosto de várias coisas em C.T., mas o que me fez realmente querer ficar, pode parecer ridículo, foi o por do sol de Sea Point. Lembro exatamente do dia em que larguei minhas malas no quarto e saí andando pela Beach Road. Tudo naquele passeio me encantou, desde o colorido do céu até a paz que ele me trouxe. Alguma coisa que eu não sei bem se estava na paisagem ou dentro de mim me avisava que eu vim para ficar. E eu sorria sozinha como se tivesse acabado de encontrar um tesouro, mas ainda não pudesse contar para ninguém. Era um misto de ansiedade e perplexidade. Era felicidade!

Isso me lembra que na leitura do meu mapa astral dizia que em determinado momento da vida eu poderia escolher onde queria morar. Um belo dia me sentiria livre o suficiente para dizer “é aqui que eu quero ficar”. Esse dia chegou mais rápido do que eu imaginei. Embora não saiba exatamente quanto tempo vou ficar, escolhi Cape Town como meu quarto no mundo, Sea Point como a minha cama, a África do Sul como a minha casa.

Não sei quanto tempo me resta, mas ainda que me reste pouco, tudo o que vivi nestes quase três meses valeu muito a pena. Experimentei sentimentos que só me trouxeram felicidade, plenitude e paz, o que me faz desconfiar que Cape Town também gosta de mim.

3.3.09

Cape Town 10: I need a hug


Hoje acordei, me olhei no espelho e concluí que além de um cabeleireiro eu preciso também de um abraço. Um abraço daqueles do meu pai: apertado, demorado, seguido de um beijo e um “eu te amo”. Se eu fizesse uma lista das melhores coisas da vida, o abraço do meu pai constaria nela. Não é um simples abraço, é uma forma de comunicação que transcende as palavras, é uma mágica troca de energia. Quando ele me abraça o coração dele diz pro meu: “eu estou contigo e sempre estarei, pode ficar tranquila”. E o meu coração, tranquilo, sorri e responde para o dele: “obrigada por ser meu pai. Obrigada!” A gente se abraça sem precisar de motivo, isso é o que eu acho mais legal. Eu não preciso estar de aniversário, eu posso simplesmente estar atravessando o corredor de casa, indo o quarto para a sala, e ser surpreendida por um longo e forte abraço. E tudo o que a gente quer dizer um para o outro nessa hora é dispensável. O silêncio do nosso abraço diz tudo.

Cape Town está ficando vazia e o meu coração também. Em duas semanas tive que me despedir de muitos amigos, de muitas pessoas que aprendi a gostar e a admirar e isso deixou um buraco enorme dentro de mim. É uma sensação de desamparo, de abandono, mas que não dura muito, eu confesso. Até porque, nos últimos dois anos da minha vida andei fazendo um “intensivão em despedidas forçadas” e a saudade já não me assusta tanto. O problema é que nessas horas a gente fica frágil, sente falta de casa, da família, do colo dos velhos amigos, enfim, de tudo o que nos dá segurança. A gente tende a se apegar demais nos amigos que conquista em pouco tempo. Eles chegam, fazem a gente feliz, se tornam importantes e vão embora... Mas como a vida é feita de indas e vindas, de encontros e despedidas, de sorrisos e lágrimas, não nos resta outra opção se não conviver com a saudade, que não necessariamente precisa ser triste, pode ser uma saudade boa.

Conjeturando a respeito percebi que no fundo não fico triste por perder a companhia das pessoas, mas pelo medo e a insegurança de não ter com quem contar caso não apareçam novos amigos para preencher o espaço. Porque as amizades que a gente construiu continuam firmes, independente do tempo e da distância. Os amigos foram embora, voltaram para as suas casas, mas continuam lá (e também no Orkut, msn, fotologs...). Cada um representa uma pecinha insubstituível no quebra-cabeça da nossa história de vida. Cada um é importante de um jeito, especial de um jeito. O problema é quando eles deixam a vaga livre e nenhum novo amigo a ocupa. Este é o meu medo. O que me assusta é esse vazio que eu nunca sei quanto tempo vai durar...