Quem sou eu

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Nasci em Floripa, vivo em Miami e sou apaixonada pela África. Adoro viajar e explorar novas culturas. Tenho especial interesse pelas diferenças. Este é o meu caderno de 'viagens' aberto ao publico. Seja bem-vindo (a)!

13.4.09

Cape Town 16: Playing by waitress


Três vezes por semana eu brinco de ser garçonete, o que além de me render algum trocado, rende também boas histórias.

Para os clientes do bar eu sou Bella, a garçonete brasileira. Quando chega alguém diferente perguntando quem eu sou, um deles sempre se adianta em responder: “Bella is brazilian”, como se estivesse denotando alguma qualidade.

Denis, um senhor careca, de óculos quadrados, detetive aposentado, esteve no Brasil em 1978, no ano em que eu nasci. Cada vez que me conta a história, repete “Salvadordabahia” como se fosse uma palavra só. O que ele mais chamou a atenção dele em Salvador foram os cantores de música ao vivo tocando violão nas calçadas. Por enquanto ele se contenta com a nossa velha e desatualizada jukebox, enquanto sonha um dia voltar a ouvir o som de Salvador.

O Derek trabalha com compra e venda de diamantes. Ex-fumante e ex-alcoolatra, hoje vem ao bar diariamente para beber uma latinha de cool drink. A lata custa R9.50 e ele deixa R20.00 de gorjeta, sempre. Ontem me trouxe também um ovo de Páscoa. Ele parou de beber e fumar depois de um enfarto e também porque cansou de perder dinheiro trabalhando de ressaca. Avaliar diamantes com 30 doses de tequila no sangue, definitivamente, não devia ser um bom negócio. Hoje ele faz academia, joga futebol, não bebe, não fuma e também não se preocupa com a origem dos diamantes. Cada um que faça a sua parte, pontua ele.

O Michel normalmente chega no bar com aparência de quem levou uma surra. E levou mesmo. Desde que começou a praticar jiu-jitsu, vive com dores no corpo. Ele tem o costume de passar o tempo todo em frente a uma máquina de jogos eletrônicos, mas ultimamente tem precisado levantar algumas vezes para se alongar. Na sua última estada no bar, pediu papel e caneta e me escreveu um poema.

When God breaths away/ your tired lies/ kisses awake/ your dreamy eyes/ and paints the heavens/ with compromise/ you’ll lift your head/ you’ll drink the sun/ your heart has space/ for everyone.

Wanco trabalha no Tiger Tiger, um barco que sai diariamente do Waterfront levando turistas para apreciar o por do sol. Só existe uma coisa que pode ser melhor do que assistir ao sunset em Sea Point. Assistir de um barco, no meio do mar, bebendo champagne. Um dia ele me pediu para cantar uma 'brazilian song'. E lá fui eu batucar um samba no balcão. No dia seguinte levei um cd que gravei para ele e acho que ele pensou que eu estava dando mole. Quando ganhou do chefe um jantar num restaurante, veio todo animado me convidar pra ir junto. Comi a melhor pasta de C.T., de frente para a Beach Rd., ao ar livre, olhando as estrelas. Olhando as estrelas para disfarçar e tentar deixar bem claro que era só amizade.

6.4.09

Cape Town 15: Three months plus


Consegui renovar o meu visto. Posso ficar em C.T. até o dia 2 de julho. Saber que tenho outros três meses pela frente significa que posso repetir a dose sem medo de ser feliz. Driblei o calendário e voltei à metade do caminho como se corre na escada rolante em sentido contrário, sentindo uma leve euforia em constatar que transgredir a ordem as vezes faz bem. Tenho mais três meses para desfrutar de um lugar que me traz muita paz. Meu chakras agradecem.

Por outro lado, ter data certa para ir embora me angustia um pouco. O bom seria não ter. O bom seria um belo dia acordar, sentar na cama, olhar pela janela e concluir: agora está na hora. Então eu faria a última caminhada em Sea Point, passaria meu último dia de sol em Clifton 4, tomaria minhas últimas garrafas de Windhoek Lite, faria minhas últimas comprinhas no Greenmarket Square, me despediria dos amigos que fiz, arrumaria as malas e embarcaria rumo a Jo’burg, São Paulo, Floripa. E deixaria C.T. com a sensação de dever cumprido.

Não sei se vou ter tempo suficiente para cumprir todas as minhas metas pessoais, mas uma coisa eu preciso muito fazer antes de ir embora, embarcar numa trip para a Namíbia, daquelas em que a gente dorme em saco de dormir e passa o dia numa tribo zulu. Não posso voltar para casa sem conhecer a África dos documentários da National Geografic. Não posso voltar para casa achando que o Waterfront é a África. Continuo atrás daquele choque cultural que move todos os viajantes convictos e que talvez, no meu caso, seja só uma desculpa para seguir viagem.

Curiosidade: está sendo gravado em C.T. o filme sobre a vida do Nelson Mandela. Atores como Matt Damon, Morgan Freeman, Leonardo Di Caprio, entre outros, estão na cidade. Um amigo meu recebeu a visita do Clint Eastwood no barco dele, lá no Waterfront. Um cliente do bar, um indiano que trabalha na Warner, é motorista do staff de Hollywood e todo dia chega contando fofocas internas do tipo: hoje levei o Morgan Freeman para almoçar no Ocean Basquet...

Cape Town 14: Cut, the cat


No exato momento em que escrevo este post, o Cut, meu amigo felino, está deitado sobre a minha cama, de olhos fechados, encolhido sobre o edredom. Agora alguém me responde: quem foi que convidou? Já vi que gato é assim mesmo: a gente dá a mão e ele quer o braço – especialmente quando lhe falta um, frise-se.

Desde que ele está se achando meu amigo, circula no meu quarto como se fosse dele. Entra, sobre na cama, se ajeita, se lambe e me olha como quem pergunta: dá para coçar as minhas costas? E lá vou eu romper a barreira do preconceito e fazer um carinho nele.

A Rica ficou até orgulhosa de mim. Já fiz carinho no gato, dei comida, deixei ele subir na minha cama, e ela só sabia dizer: “well done, Ambella. I’m proud of you.” Confesso que nem foi tão ruim assim, tirando a coceira que tive no corpo depois... Nunca levei a sério essa alergia a pelo de bicho, até porque eu nunca tinha convivido com um para testar, mas agora vi que ter um gato muito próximo de mim pode me render uma comichão animal! O problema é que ele não sai mais daqui. Desde o dia em que fiz carinho nele a primeira vez, ele me ama.

Esses dias eu estava tirando um cochilo, assim que cheguei do trabalho e de repente, sinto uma coisa pular quase em cima de mim. Pensei: pqp, não estou acreditando! E ele me olhava com uma cara debochada, como se perguntasse: tem um cantinho aí pra mim? Ok, Cut, na falta de uma companhia menos peluda, pode se ajeitar aí do meu lado. Não sei por que, mas nessa hora lembrei que a gente nunca deve desprezar quem gosta da gente.